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quinta-feira, 29 de julho de 2010

#77 - Nascido nas águas de janeiro


Ele tinha que nascer das águas, entretanto o conserto de um cano na região ditava a secura dos dias. Exatamente por isso os céus enviaram chuvas torrenciais naquela noite em que o carioca Tom Jobim nasceu. 25 de janeiro de 1927.
Regido pelos signos contemplativos e viajores da natureza, água e ar, Tom desde cedo aglutinou-se ao mar e aos vôos da imaginação. Até isso ganhar função criativa quando, aos 14 anos, deparou-se com um piano na garagem de sua casa.
Para ele, piano era coisa de mulherzinha. Está aí a prova de que seu destino era claro, pois o rapazinho não conseguiu largar o piano desde então, chegando a estudar às vezes 10 horas por dia.
Com dedicação, experimentava acordes, queria ser concertista, porém seus professores o aconselhavam a tornar-se compositor. Esta centelha só se concretizaria muitos anos depois. Ainda era um "janeiro". Depois de um "fevereiro" trabalhando como arranjador e especializando-se em orquestração, então chegaram as águas de março.
Tom Jobim pôde então encantar o mundo com músicas cujas melodias percorriam caminhos imprevisíveis, embalados por harmonias por vezes nostálgicas, melancólicas e eufóricas. Um bom exemplo da riqueza harmônica, ou do que eu chamaria de "sensação de reviravoltas musicais" de Tom, é a canção "Passarim":
Tom Jobim - Passarim:
Bom proveito!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

#75 - Kala Marka - Nuevo Mundo. Mundo Nuevo


Como amante incondicional de música andina, eu não poderia deixar de compartilhar com vocês esta que é para mim, até o momento, a empreitada musical mais bela dos últimos anos.

Aparentemente alguém resolveu juntar o grupo boliviano Kala Marka, uma orquestra, coral com mais de cem crianças para tocarem músicas tradicionais andinas.

Peço desculpas pela escassez de informações que ainda tenho a respeito da iniciativa. Quem sabe quando minha cópia do DVD chegar da Bolívia (já foi encomendada! Vivas!) haja nele maiores detalhes.

O que sei é que tal concerto resultou em interpretações que certamente os músicos tradicionais andinos nunca vivenciaram, e numa sonoridade tão rica quanto pura. Pura como essa cultura nunca deve deixar de ser.

Agora deixa eu mostrar algumas de minhas preferidas:

India Leñera:
www.youtube.com/watch?v=YyOvQxY3JSY

Malacun Wawapa:
www.youtube.com/watch?v=wjWOdeWTgvE

Cancion y Hayno:
www.youtube.com/watch?v=mk3li1jFJ7s

El Dorado:
www.youtube.com/watch?v=VJbpqBXFnc8

Bom proveito!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

#73 - Um Compositor Titânico


Normalmente os diretores de filmes, por mais que acreditem num novo trabalho, não tem qualquer certeza de que ele será um sucesso. Isto acontece mesmo com filmes que hoje temos como obras-primas.

Uma delas, bastante premiada e aclamada, foi uma exceção quanto à expectativa de seu diretor. Mel Gibson, já exausto e a poucas semanas de estrear o filme que dirigia e estrelava, tinha convicção de que ali estava algo muito especial. Acontece que ainda havia um importante detalhe a ser adicionado a seu tão querido “filho”: trilha sonora. O receio de Mel Gibson, de que a música não atingisse a sensibilidade e grandeza necessárias a seu filme fez com que ele até especulasse deixar algumas cenas sem música, com receio de que ela as arruinasse. Felizmente, quem assistiu “Coração Valente” (1995) já sabe que esse drama (o do diretor, claro) teve um final mais que feliz.

Contratado para compor a música do filme, o americano James Horner emocionou Mel Gibson a ponto dele afirmar que estava diante de uma das trilhas sonoras mais belas da história. A exemplo disso, basta uma olhada nessa pequena cena: (www.youtube.com/watch?v=YzRx_qUWjOw).
De fato, o filme ganhou cerca de 20 prêmios cinematográficos. Aí vão dois temas completos:

James Horner – “A Gift of a Thistle & The Secret Wedding” (Coração Valente):
http://www.youtube.com/watch?v=Vgw1DqgtI0E&feature=related

Mesmo com trabalhos tão expressivos, James Horner talvez seja o compositor cinematográfico mais criticado e controverso. A maior acusação que os críticos (ou músicos frustrados, talvez...) lhe fazem é o fato dele reutilizar material de suas trilhas anteriores, ou de ser um tanto repetitivo. Sinceramente, não vejo problema num músico copiar a si mesmo, visto que existe, além de tudo, certas dificuldades jurídicas em se processar a si mesmo por plágio...

O maior exemplo da citada reutilização são as duas trilhas a seguir. Repare que ambas são a mesma música, com arranjo levemente adaptado:

James Horner – The Machine Age (Introdução de “O Homem Bicentenário”):
http://www.youtube.com/watch?v=quINm_8HrKg

James Horner – A Kaleidoscope of Mathematics (Uma Mente Brilhante):
http://www.youtube.com/watch?v=mZI3VWSu0nM

A fantástica trilha de abertura do filme “O Homem Bicentenário” chamou muito a atenção do diretor Ron Howard, quando ele dirigia o filme “Uma Mente Brilhante”, achando que a faixa poderia ilustrar o interior da mente do personagem John Nash com a dose perfeita de loucura e beleza. Aliás, a voz feminina que ouvimos nesta versão pertence a Charlotte Church, a mesma garota que participou da canção de abertura da novela Terra Nostra, talvez muitos se lembrem...
Ah, e só para evitar a falta da citação, vale lembrar que sua trilha mais popular talvez seja a do filme "Titanic" (inclusive a canção interpretada por Celine Dion).

Bom proveito!

segunda-feira, 2 de março de 2009

#66 - O Canto das Montanhas


É estranho como nós, quase sem perceber, voltamos boa parte de nossa apreciação das músicas aos intérpretes. Não há dúvidas de que o talento dos músicos, cantores, serve não só para materializar algo que pulsa temporariamente no mundo abstrato, como também para dar às músicas diferentes níveis de brilho e riqueza.

Um fato causou uma inversão de valores em mim, quanto a este assunto. Ao tomar contato com a belíssima contribuição do grupo brasileiro Tarancón, percebi que as espetaculares canções folclóricas andinas (sobretudo bolivianas) perdiam completamente o encanto na voz de intérpretes refinados.

Ao serem ouvidas, por outro lado, sob o espírito de artistas menos “dotados” (na falta de outro termo), que expressam simplicidade em suas performances, tudo ganha um espírito real e muito envolvente.

Talvez isto se deva ao fato da arte andina ter por princípio, mesmo sob temas tristes, a expressão da alegria e do pulsar vigoroso da vida. A cultura musical, sobretudo, prestava-se a reuniões familiares, de companheiros, ou seja: comunhão.

É sempre muito difícil descobrir quem são os autores de músicas tradicionais ou folclóricas. Mas fica aqui uma reverência ao citado grupo Tarancón, sem o qual muitas destas obras-primas ficariam relegadas em seus locais de origem.

- Minha preferida: “Boquita de Cereza”:
http://www.youtube.com/watch?v=ujEoQP_UlQc

- Canção de protesto: “Pobre Mi Gente”:
http://www.youtube.com/watch?v=PoEMraUFqfU

- A respeito do rito de rua Tinku, que prepara jovens para a fase adulta “El Tinku”:
http://www.youtube.com/watch?v=PuciXZkFIMI

- Adendo, "Ojos Azules", que tanto procurei há algum tempo e só agora encontrei:
- "Sariri":
Bom proveito!

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

#63 - Com quantos versos se faz uma canção...


Em 1995 acontecia mais uma edição do Festival Eurovisão, um concurso de canções televisivo dos mais importantes do mundo, com uma audiência que já chegou a centenas de milhões de espectadores. Como sempre, vários países, não só da Europa, estavam com suas canções originais inscritas e seus respectivos intérpretes.

No ano citado, em especial, algo ocorreu de intrigante... Dentre todas as belas canções apresentadas, foi escolhida como vencedora absoluta a de uma dupla formada por uma violinista e um pianista. O detalhe que chamou a atenção sobre esta vitória foi que a tal música dificilmente poderia ser denominada como “canção”, e não tinha mais do que três ou quatro pequenos versos, em poucos segundos de voz no início e final de uma obra absolutamente instrumental.

Seria muito comum, num caso desses, que houvesse uma grande polêmica, e que os “maus perdedores” protestassem contra o resultado, talvez até com razão. Mas ninguém se levantou para contestar a vitória de “Nocturne”, e foi a partir dela que a dupla Fionnuala Sherry e Rolf Løvland (ela irlandesa, ele norueguês) surgiu para o mundo, sob o nome de Secret Garden.

Ouvindo a citada música, compreendemos por que coube aos demais apenas resignarem-se...

- Secret Garden – “Nocturne”:
http://www.youtube.com/watch?v=iqF9iqBZKv0&feature=related

- Secret Garden – “Song from a Secret Garden”:
http://www.youtube.com/watch?v=wasYNNfnfVE

Bom proveito!

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

#62 - "Sorria", a última mensagem do Vagabundo.


Aqui neste humilde blog já foram retratadas dezenas de obras belíssimas, bem como seus criadores. Alguns deles me são especialmente caros, e ainda assim pude formular algo a respeito deles.

Mas tentar falar qualquer coisa sobre Charlie Chaplin conseguiu me causar, pela primeira vez, uma completa sensação de impotência textual. Diante de tão sublime espírito, as palavras parecem sacrilégio, e se recusam a surgir...

Passo então para o objetivo central deste post, que é a expressão da criatividade musical de Chaplin. Trata-se das canções compostas por ele para o último filme com seu famoso personagem Vagabundo: “Tempos Modernos”.

- “Smilena voz de Nat King Cole:
http://www.youtube.com/watch?v=5sqLRNVmR44

- Smile”, versão do filme:
http://www.youtube.com/watch?v=Ps6ck1ejoAw

- A Non-Sense Song” (primeira vez que se ouve a voz de Chaplin no cinema):
http://www.youtube.com/watch?v=eZhSvSvMBgU&feature=related


Sorria...

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

#59 - Basil - O Bárbaro


Eu aposto com toda segurança: se você perguntar a qualquer fã de RPG ou temas medievais, qual é a trilha sonora favorita dele, o indivíduo que não responder “Conan – O Bárbaro” só o fará por nunca tê-la ouvido.

Esta obra musical antológica foi composta por Basil Poledouris, um grego criado nos EUA entre o som do órgão de sua igreja, alguns pequenos encargos eclesiásticos e aulas de piano.

O que mais impressiona no estilo de Basil é sua capacidade de mergulhar tão fundo, e com tanta propriedade, em aspectos extremamente distintos da música. A trilha de “Conan – O Bárbaro” é um resumo desta sua genialidade, que vai das mais potentes forças telúricas ao mais sublime lirismo.

Sua filmografia (curta para um artista de seu nível) também reflete esse extremismo, já que nela há necessariamente filmes bastante adversos entre si (“Conan” e “Free Willy”, ou “Robocop” e “A Lagoa Azul”).

A seguir vão links para sua obra-prima, algumas de minhas partes favoritas de “Conan – O Bárbaro”. Por último posto um vídeo raríssimo, feito por um espectador: o próprio Basil regendo seu tema mais famoso e recebendo uma das mais longas ovações de sua vida, pouco antes de falecer em 2006.

“Conan, O Bárbaro – Anvil of Crom”:
http://www.youtube.com/watch?v=sHDmXtW9Yx0

“Conan, O Bárbaro – Theology / Civilization”:
http://www.youtube.com/watch?v=Gur7kJythgM&feature=related

“Conan, O Bárbaro – Wifeing”:
http://www.youtube.com/watch?v=4HOauI2KBS0

Basil Poledouris regendo:
http://www.youtube.com/watch?v=NaBBQsRvwkU&feature=related

Bom proveito!

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

#53 - Casamentos perfeitos, filhos notáveis


Era início da década de 60, e quatro amigos (as garotas Michelle e Cass; e os garotos John e Denny) assistiam televisão. De repente, surge uma entrevista com os lendários motoqueiros Hell’s Angels. As meninas agitam-se com a visão de um belo exemplar masculino encasacado que diz: “Aqui nós chamamos nossas mulheres de ‘mamas’!”. Imediatamente, Michelle e Cass suspiram, dizendo em uníssono o quanto adorariam ser “mamas”.

E a questão foi de pura lógica: se elas seriam “mamas”, restaria a John e Denny serem os “papas”. E assim surgiu o “The Mamas & the Papas”, grupo vocal que criava suas próprias canções, e não bastasse a beleza das mesmas, davam a elas uma dinâmica de vozes que tornou-se marca registrada na história da música.

O “The Mamas & the Papas” foi um dos únicos grupos norte-americanos que conseguiu competir na época, em primeira grandeza, com a “invasão britânica” que dominava as paradas de sucesso (e encabeçada, para se ter uma idéia, pelos Beatles).

Sua maior obra-prima é, sem dúvida, a canção “Califórnia Dreamin’”, exemplo básico e clássico da genialidade com que construíam o jogo das vozes:

http://www.youtube.com/watch?v=dN3GbF9Bx6E

- “Monday, Monday”:
http://www.youtube.com/watch?v=LW7NpsHR3K0

Bom proveito!

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

#48 - O vento que cresceu a barba


Dependendo das circunstâncias gerais em que o faça, ouvir uma boa música deles é como fazer, no meio de um espasmo de felicidade, uma terrível piada sobre seu melhor amigo; é o encontro com a conclusão sábia de que aquilo foi mais você do que o você cotidiano, sendo este último a versão improvisada de um bom manequim social.

Parece espantoso que muitos dos fãs de Los Hermanos relatem uma sensação de “invasão” quando envolvidos pelas canções do grupo, e falo de “invasão” no sentido injusto mesmo, como a possível sensação de alguém sentado no meio de uma roda onde todos pudessem ler seus pensamentos. Mas não tenho muita certeza de que este resultado seja tão misterioso...

Uma das características mais notáveis na banda é a precisão com que as letras são assentadas sobre a melodia, bem como seu temas e desenvolvimentos. Em suma, ao mesmo tempo em que as letras criadas não interferem na idéia melódica, elas não perdem substância por uma comum priorização de um elemento ou outro: letra e música convergem perfeitamente.

O resultado disso é que a bela musicalidade da banda prepara nosso terreno emocional para a série de panoramas e imagens a que as letras nos submetem, e é para nós impossível deixar de tentar decifrá-las. E é por culpa deste ímpeto pela explicação que muitas vezes empobrecemos algumas das letras do grupo, atribuindo a elas uma pretensa “complexidade poética”.

Alguns já descobriram a beleza que é apreciá-las em seus sentidos mais óbvios e simples, como a maravilhosa “Além do Que Se Vê”, que Marcelo Camelo (letra e música) compôs para sua mãe pintora: http://www.youtube.com/watch?v=P9lvAQdFwyM

O Los Hermanos tem uma trajetória (ainda que recente) bem interessante. Após um álbum de estréia com estilo musical frenético e meloso (até debochado), veio um segundo disco bastante diferente, mais introspectivo e refinado, cujo mote parecia ser mesmo o susto que acomete o folião quando a festa acaba. A primeira música deste álbum dá esta clara idéia, introduzida por um trombone solitário e triste, que parece lamentar-se num salão vazio e abarrotado de sepentina e confete:

“Los Hermanos - Todo Carnaval Tem Seu Fim”:
http://www.youtube.com/watch?v=J16o9bYS-no

"Casa Pré-Fabricada" (versão de Roberta Sá):
Bom proveito!

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

#46 - O Espírito Continua...


Com a licença da liberdade de expressão, e sem receio de contrariar os puritanos, afirmo com plena segurança que o mais belo capítulo da história do Rock Progressivo ainda estava para ser escrito mesmo após seu declínio a partir dos anos 80.

Este capítulo começa em Cuba, no ano de 1993, com um triste acidente. Um jovem chamado James Labrie estava há pouco tempo integrado num trabalho no qual podia se considerar feliz e realizado. Cantor desde os 5 anos de idade, dono de um talento inigualável e timbre único, passara considerável tempo pulando de grupo em grupo sem nenhum sucesso, até que em 91 consegue ser contratado como vocalista da banda Dream Theater, que na época já era respeitada como um dos únicos mantenedores consistentes do rock progressivo. Mas sua felicidade não demorou muito para ser fatalmente abalada. Dois anos depois, numa viagem ao citado país de Fidel, sofreu uma gravíssima intoxicação alimentar que, por incrível que pareça, culminou no rompimento de suas cordas vocais.

Tentando tratar-se com um punhado de especialistas, recebeu de todos a triste notícia de que nada mais podiam fazer. Após um tempo de repouso, o Dream Theater entrou em estúdio para um novo álbum, e contrariando todas as recomendações médicas James decidiu participar, e a muito custo conseguiu gravar com a banda. Sem conseguir ficar longe dos palcos, saiu em turnê, e seu desempenho foi desesperador.

Ao final da turnê, James, extremamente deprimido e prejudicado, decidiu largar a banda. No entanto, seus companheiros recusaram-se a aceitar sua saída, e com o comovente apoio que recebeu de todos, conseguiu algum fôlego para seguir em frente. E eis que os músicos do Dream Theater estavam então preparados para dar à luz seu carimbo na história: o álbum “Scenes From a Memory”, lançado em 1999.

Todo o disco conta a história de um homem que sente-se atormentado sem saber o motivo, até que decide fazer uma regressão de memória. A partir daí, as músicas passam a narrar a descoberta de uma vida passada cujos incidentes marcaram o homem, bem como sua jornada pelo inconsciente a fim de encontrar sua paz de espírito.

A temática da imortalidade da alma, da continuidade da vida após a morte, é tratada de forma memorável durante a trajetória do personagem, e a subordinação disto à musicalidade da banda transforrna a audição num momento transcendente. E tal transcendência não se dá pelas antigas “caleidoscopias sonoras” ou pelas ilusões dos ácidos, mas pelo desafio das harmonias e pelo poder de som do grupo.

Contemplemos os três momentos finais deste trabalho, os trechos mais trágico-operísticos de “Scenes From a Memory”, que culminam, em minha humilde opinião, no encerramento mais belo de todos os melhores álbuns do gênero. E nos emocionemos, também, com a valentia do cantor James Labrie, ainda prejudicado na voz, mas vivo de alma:

-Throught My Words / Fatal Tragedy:
http://www.youtube.com/watch?v=XWuCdV5VWWU&feature=related

-The Spirit Carries On:
http://www.youtube.com/watch?v=avPdOAKl8w4&feature=related

-Finally Free:
http://www.youtube.com/watch?v=DM02oyWWxNY&NR=1

Bom proveito!

terça-feira, 29 de julho de 2008

#43 - Podem os mestres ter ídolos?

Era verão de 1812. Na estância termal alemã de Toeplitz, dois homens caminhavam de braços dados, muito juntos. Mas assim estavam não pela privacidade da conversa, já que um deles repetia seus assuntos quase sempre em alto e bom som ao ouvido de seu amigo. Falavam animadamente sobre música, poesia, e dividiam seus felizes ideais de revolução, liberdade e igualdade.

Em dado momento, um pequeno comboio de nobres cruza-lhes o caminho. Imediatamente, Goethe solta seu braço do amigo e abre para os ilustres um espaço quase tão grande quanto sua reverência e sorriso. Beethoven olha aquilo com espanto, e sua amizade com Goethe, que mal havia começado, já parte para um inevitável afastamento apático.

Beethoven era leitor das obras de Goethe (mais conhecido por “Fausto”) desde sempre, e diariamente devorava toda a criação do escritor. Sua admiração exacerbada possivelmente devia ter uma razão além do valor literário próprio. O fato é que Goethe costumava dizer abertamente, e com freqüência, que a música era o que movia seu amor pelas palavras, que a música era sua inspiração e a forma de arte perfeita para dar a seus escritos um valor completo e verdadeiro.

Na ocasião do encontro de Beethoven com seu ídolo, o compositor já havia finalizado a música que lhe fora encomendada para uma nova encenação de uma antiga peça de Goethe, chamada “Egmont”. Ser convocado para musicar uma peça de Goethe (ainda mais algo que tratava da luta pela liberdade contra o “invasor”) deixou Beethoven nas nuvens, e o resultado é que a abertura de “Egmont” é executada até os tempos atuais em concertos pelo mundo todo.

Não se sabe o quanto esse período e seus acontecimentos influenciaram o mestre na criação de sua Sétima Sinfonia (composta no ano de seu encontro com Goethe), mas o Segundo Movimento desta – uma das obras mais enigmáticas e perturbadoras do mestre – parece carregar um pequeno fardo da abertura de "Egmont".

-Beethoven – “Abertura de Egmont”:
http://www.youtube.com/watch?v=M1yxWXHLWcY

-Beethoven – “7ª Sinfonia, 2º Movimento” (não pergunte quem é a mulher do vídeo... foi a melhor versão que encontrei):
http://www.youtube.com/watch?v=5V5k0Plh-jY

Bom proveito!

quinta-feira, 17 de julho de 2008

#42 - Nem sempre há chocolates nas caixas de chocolates


Uma pena branca flutua livre, levada ao sabor da brisa. Um suposto acaso a faz pousar graciosamente nos pés de um aprumado rapaz, sentado no ponto de ônibus. Ele a recolhe e guarda dentro de um livro. Passa, em seguida, a contar sua história para a pessoa que está ao lado.

Assim começa uma das mais singelas e grandiosas obras que o cinema já trouxe ao mundo: a história de Forrest Gump, um americano que, apesar de ter um QI baixíssimo e ser considerado retardado, traz em sua bagagem de vida uma coleção inimaginável de conquistas e aventuras.

O compositor Alan Silvestri - muito conhecido pelo tema de "De Volta Para o Futuro" – (http://www.youtube.com/watch?v=5Lh0fi6KmaA), criou para o personagem Forrest um tema que não indica a ostentação de seus êxitos, ou a perseverança que o levaram a suas vitórias. Estranhamente, o tema musical ligado a ele é simples e inocente. Simples e inocente como a própria alma de Forrest.

Outra música notável da trilha de Silvestri é aquela que envolve o amor de Forrest por Jenny (aos 2:16 no link), amor este que permeia toda a sua vida, e que permanece imutável apesar das constantes diabruras da garota.

O link contém ambas as músicas citadas (em ordem respectiva) e algumas mais:

-"Alan Silvestri - Forrest Gump" (Medley):
http://www.youtube.com/watch?v=FcOt6mfjxeA&feature=related

Bom proveito!

#41 - Não quer entrar para tomar uma xícara de café?


Creio que todos nós perguntamos um dia, ao assistir um desses filmes espetaculares, como há neles músicas tão interessantes, e o principal: como essas músicas se encaixam com tamanha sincronia e perfeição às cenas?

Pode parecer que a trilha sonora para filmes foi algo criado para ser assim, desde sempre, mas não foi. Embora seja verdade que a música tenha feito parte dos filmes antes mesmo da voz humana, ela era (nos seus primórdios) apenas um recurso para realçar situações e emoções primárias. Por exemplo: havia um tema padrão para salientar a chegada do vilão, para fazer rir, para reforçar tristeza, assim por diante.

Qualquer um que conheça um pouco a vida de Max Steiner (1888-1971), sabe que não é exagero algum dizer que ele foi o pai da trilha sonora, em todos os seus melhores aspectos que temos hoje e que tivemos ao longo de tantas décadas.

Steiner foi um gênio da música que não mediu esforços para romper todos os limites vigentes no processo musical cinematográfico. Contratado como chefe do departamento musical do estúdio RKO em 1929, teve ferrenhas brigas com Deus e o mundo para que a trilha sonora ganhasse espaço de legítima contribuição artística nos filmes. Aos poucos suas batalhas foram sendo vencidas, devido é claro à sua sublime criatividade.

Logo, Steiner compôs uma trilha que revolucionou a música para cinema e estabeleceu todos os seus melhores padrões: a primeira versão de King Kong (1931). Esta trilha surpreendeu o meio cinematográfico, pois aparentemente ninguém havia pensado que a música poderia aglutinar-se tão bem às cenas e dar-lhes uma profundidade emocional tão grande, além, é claro, de sincronizar-se à ação das imagens.

Eis aqui uma das cenas mais antológicas da história. Reparem o poder que a música de Max Steiner lhe imprime. Ela faz parte do filme “E o Vento Levou” e praticamente resume qual o papel mais rico da música para cinema, dando substância sobrenatural ao clímax da personagem após uma dramática trajetória de dificuldades:
http://www.youtube.com/watch?v=rgjHuOnwhFA

E o Vento Levou - Tema de Tara:
http://www.youtube.com/watch?v=1KBT4BYjr1I

Seleção de temas de Max Steiner:
http://www.youtube.com/watch?v=03jiCoXaU5Y

Bom proveito!

quarta-feira, 2 de julho de 2008

#38 - Requiem para uma Bruxa Doida


Difícil crer que algo assim foi feito em 1939, sem qualquer tecnologia computadorizada. Apenas com talento e criatividade, esta sequência do clássico "O Mágico de Oz" não é apenas uma referência no gênero musical, como também um exemplo de número musical em substituição a uma extensa narrativa. Pura aula de fantasia. Deleitem-se com a maravilhosa Judy Garland (Dorothy) e o povinho pequeno, com canção de Harold Arlen (letra) e Herbert Stothart (música) feita para a cena em que a menina pousa na Terra de Oz matando, sem querer, uma temida bruxa:

“Ding Dong! The Witch Is Dead” (ponham essa janela diminuída ao lado e divirtam-se acompanhando a tradução):
http://www.youtube.com/watch?v=XOEq-ImGWJ0

(Glinda)
Saiam, saiam de onde quer que estejam
E conheçam a jovem dama que caiu de uma estrela
Ela caiu do céu, caiu de muito longe
E “Kansas” ela diz ser o nome da estrela.
(Munchkins)
“Kansas” ela diz ser o nome da estrela.
(Glinda)
Ela traz boas notícias, vocês não ouviram? Quando caiu de Kansas um milagre ocorreu!
(Dorothy)
Na verdade não foi milagre
O que houve foi só isto:
O vento começou a mudar, e a casa a balançar! E de repente as dobradiças começaram a soltar
E então a bruxa, para satisfazer seu desejo
Veio voando em sua vassoura desastrando-se num tombo
(Munchkin homem)
E oh!, o que aconteceu então foi ótimo!
(Munchkins)
A casa começou a balançar, e a cozinha abriu uma fenda
Ela pousou sobre a bruxa doida bem no meio de uma vala
O que não foi uma situação saudável para a bruxa doida.
A casa começou a balançar, e a cozinha abriu uma fenda
Ela pousou sobre a bruxa doida bem no meio de uma vala
O que não foi uma situação saudável para a bruxa doida
Que começou a estrebuchar, e reduziu-se a um mero trapo
Do que antes havia sido uma bruxa doida.
(Munchkin 1)
Nós te agradecemos docemente, por fazer isso tão habilmente
(Munchkin 2)
Você a matou tão completamente
Que nós agradecemos docemente
(Glinda)
Deixemos as adoráveis notícias se espalharem
A bruxa velha e doida finalmente morreu!
(Munchkins)
Ding-dong! A bruxa morreu!
Que velha bruxa? A bruxa doida!
Ding-dong! A bruxa doida morreu!Acordem, seus dorminhocos!
Esfreguem os olhos e saiam da cama!
Acordem! A bruxa doida morreu!
Ela se foi para onde os gnomos vão
Pra baixo! Pra baixo! Pra baixo!
Yo-ho! Vamos nos soltar e cantar e tocar os sinos!
Ding-dong! O feliz canta alto! Canta baixo
Deixem todos saberem! A bruxa doida morreu!
(Prefeito)
Como prefeito da cidade Munchkin
No condado da Terra de Oz
Eu dou-lhe boas-vindas muito majestosamente!
(Juíz)
Mas nós temos de verificar isto legalmente
Pra ver…
(Prefeito)
Pra ver…?
(Juíz)
Se ela…
(Prefeito)
Se ela…?
(Juíz)
Está moralmente, eticamente…
(Munchkin 1)
Espiritualmente, fisicamente…
(Munchkin 2)
Positivamente, absolutamente…
(Munchkin homem)
Inegavelmente e confiavelmente… morta!
(Legista)
Como legista afirmo que a examinei completamente
E ela não está meramente morta
Mas sim muito sinceramente morta!
(Prefeito)
Então este é um dia de independência
Para todos os munchkins e seus descendentes
Deixemos as boas notícias se espalharem
A bruxa velha e doida morreu!

-(E não se pode falar em O Mágico de Oz sem adicionar esta canção):
http://www.youtube.com/watch?v=10w_sEcHlGs&feature=related

Bom proveito!

#37 - Requiem para um Vivo


Era março de 1791. Wolfgang Amadeus Mozart estava em sua casa em Viena, sofrendo estranha obsessão pela morte, após o falecimento de seu pai, quando um estranho bate à sua porta.

Recusando-se veementemente a se identificar, o estranho encomenda de Mozart um Réquiem (obra musical de homenagem aos mortos), e dá-lhe um vultoso adiantamento, avisando que voltaria em um mês.

O que pareceria então apenas mais um trabalho transformou-se num transtorno insano. Mozart, com a saúde debilitada, deprimido e afeito a idéias sobrenaturais passou a acreditar que a encomenda misteriosa daquele anônimo era um aviso do Destino. Um aviso de que aquele Réquiem era o anúncio de seu próprio funeral.

Mozart faleceu antes de concluir a obra, e embora haja especulações, a identidade do responsável pela encomenda permanece em relativo mistério. A versão mais aceita é a de que o homem era um enviado do conde Franz Walsseg, cuja esposa havia morrido. Ao que dizem, Franz pretendia que a obra fosse tocada em homenagem à esposa e afirmar-se autor dela perante os presentes, coisa que já havia feito antes.

Embora possa-se ouvir o Réquiem de Mozart inteiro, o mestre apenas pôde concluir uma parte dela. Coube a seu discípulo Franz Xaver Süssmayer a tarefa de tomar as partes e anotações de Mozart e finalizar aquela que seria uma das obras-primas da música clássica.

A parte que ouviremos chama-se “Domine Jesu Christe”, uma das mais vigorosas e extraordinárias de todo o Réquiem. Reparem a incrível perfeição com que as vozes e frases do coral se entrelaçam numa mistura que chega a parecer um caos harmonizado.

-“Wolfgang Amadeus Mozart – Réquiem em Ré Menor (Domine Jesu Christe)”
http://www.youtube.com/watch?v=xO3nT5cvaOo

- (este vídeo contém alguns problemas, mas condiz melhor com a força da música):
http://www.youtube.com/watch?v=xrkRX1UEZcg

Bom proveito!

terça-feira, 17 de junho de 2008

#34 - Toma tua guitarra e me siga


Não é novidade que conforme o mundo do rock foi estabelecendo a febre dos “guitar heroes” (termo usado pra designar os guitarristas que tinham talento e mais fama, às vezes, que todos os membros de uma banda), foi surgindo no mundo uma quantidade infindável de tocadores ávidos por velocidade nos dedos, fator que engana os ouvidos inadvertidos e substitui o vazio de sentido musical de quem tem mais ego que criatividade.

No meio destes, Steve Vai surge como um profeta a mostrar para as ovelhinhas como é que se faz. Não há notícias, no meio guitarrístico, de alguém que alie como Steve extrema criatividade, flexibilidade e disciplina fora do comum. Dedicando-se a uma rotina de estudo diário de 8 ou mais horas, Steve impressiona não só na dominação de estilos e técnicas mas, para aqueles que observam o instrumento, é possível perceber em suas músicas que a criação das mesmas transforma seu modo de executá-las e frequentemente nos deparamos com sonoridades inusitadas. Isto é uma marca registrada, já que ouvindo outros grandes guitarristas, percebemos que grande parte das composições destes são advindas de técnicas.

Para Steve, a música origina o resto. Assim, para quem não está familiarizado com o instrumento, seria muito proveitoso ao ouvir prestar muita atenção às diferentes qualidades sonoras, texturas e vogais que ele consegue.

A primeira música sugerida, “For The Love of God”, é sem dúvida sua criação mais bela e famosa. Reza a lenda que Steve, ao ter a inspiração para o tema, ficou três dias sem comer nem dormir, até que concluísse a composição. Talvez este período desesperador tenha dado o nome, que traduzido seria “Pelo Amor de Deus”.

Nunca se sabe se essas lendas são verdade... Mas em se tratando de Steve Vai, e de sua entrega absoluta à guitarra, não me supreenderia se alguém viesse aqui dizer: “Essa lenda é mentira, na verdade ele levou oito dias”.

“Steve Vai – For The Love of God”
http://www.youtube.com/watch?v=avKhKDef9Vo&feature=related

“Steve Vai – Tender Surrender”
http://www.youtube.com/watch?v=Yw74sDWPH7U&feature=related

Bom proveito!

terça-feira, 3 de junho de 2008

#30 - Finalmente, Romance nas Estrelas!


Não há dúvidas de que a trilha sonora da série cinematográfica “Guerra nas Estrelas” foi o que tornou John Williams o nome mais popular do cenário, e teve o feito de trazer a música orquestrada para o cotidiano dos jovens que alienavam-se cada vez mais no rock. Em 1977 o primeiro filme foi lançado, mas ele era, na verdade, a quarta parte de uma saga. As partes 5 e 6 vieram em 1980 e 1983.

Mas não é desta época que quero falar. George Lucas, decidido por lançar as três partes iniciais para fechar sua saga, trouxe ao mundo Star Wars – Episódio I: A Ameaça Fantasma (1999), Star Wars – Episódio II: O Ataque dos Clones (2002) e Star Wars – Episódio III: A Vingança dos Sith (2005).

Mas o fato interessante é que esta nova fase de trabalhos teve uma oportunidade pela qual o mestre John Williams sentiu-se muito emocionado e cativado, especificamente para o Episódio II: em nenhum dos quatro filmes produzidos anteriormente havia sequer um tema romântico (ou tema de amor). Em “O Ataque dos Clones”, John comporia uma melodia para ilustrar o amor entre Padmé Amidala e Anakin Skywalker, ambos vivendo um romance proibido, trágico, de que viriam a nascer Luke Skywalker e a princesa Léia. Padmé falece no parto, e Anakin torna-se o antológico vilão Darth Vader.

Para este romance, John Williams compôs o que é, sem dúvida, um dos temas de amor mais cativantes e inspirados de que teremos notícia em muito tempo. Recheado de texturas e facetas, a música “Across The Stars” conduz-nos através de toda uma gama de sensações dramáticas...

... O momento de angústia que parece surgir em 1:39, mas que imediatamente torna-se um sorriso breve... O momento de tensão e ira que parece afogar o tema principal que emerge rarefeito de 2:04 a 2:42, trecho em que vai, pouco a pouco, mutando-se do lirismo para o marcial, dando talvez uma prévia da transformação de Anakin em Darth Vader.

-John Williams - Across The Stars:
http://www.youtube.com/watch?v=mXIpxrDYii8&feature=related

Bom proveito, e pegue o lencinho...

terça-feira, 27 de maio de 2008

#27 - O Cavalheiro Solitário


Era uma noite de muita expectativa na cidade de Hamburgo. Era 1848. Um jovem virtuose do piano, de apenas quinze anos, estava para dar seu primeiro concerto público, organizado por ele próprio.

A sala encheu-se, e o pianista agitou os ânimos da platéia com um repertório cheio de agilidade e obras do gosto popular. Foi um sucesso estrondoso. O jovem músico, apalermado com a situação, do tipo que nunca vivera, estava nos bastidores a tomar fôlego, quando um homem entrou no recinto feito um furacão. O rapaz voltou-se para ele, e em sua hipnose extasiante abriu os braços para receber uma suposta congratulação calorosa. Mas Eduard Marxen, seu mestre, agarrou-o pelo paletó e o sacudiu:

- O que pensa que está fazendo, Johannes?
- O que foi, mestre? –
assustou-se o jovem.
- É isto que você quer? Afundar nesse lodo de sorrisos e sucessos, enquanto joga fora sua alma para agradar todo mundo com esse monte de lixo?

Johannes teve um choque. Era o indivíduo mais sincero e humilde que o mestre Marxen conhecia. Queria ser compositor, mais do que tudo, e deixara-se levar, tão fácil, pela ilusão do sucesso barato. A partir de então, continuou estudando a fundo, e passou a finalizar suas primeiras obras oficiais.

Joseph Joachim, um grande violinista da época, após fazer algumas apresentações com Johannes, ficou maravilhado com seu talento, e logo arranjou-lhe uma carta de apresentação para que Johannes conhecesse Franz Liszt, pianista e compositor aclamado como o mais espetacular virtuose da época. Assim, o pobre rapaz viu-se, de repente, enfurnado numa sala em Weimar, junto de célebres convidados e diante do grande Franz Liszt. O clima de sofisticação e superficialidade que cercava o momento deixou Johannes um tanto perturbado. Liszt já havia tido contato com algumas obras de Johannes, e pediu que ele tocasse alguma delas para todos. O pedido foi gentilmente recusado, mas Liszt, sem fazer-se de rogado, pegou uma das partituras e tocou ele mesmo. Os convidados ficaram encantados, e Liszt, empolgado, anunciou:

- Vou agora tocar uma de minhas peças para que você conheça. – E executou uma de suas obras mais espetaculares, tirando o fôlego dos que ali estavam. Ao terminar, sorrindo, virou-se para analisar a expressão de Johannes Brahms, e teve um choque ao notar que ele estava cochilando na poltrona.

Brahms não teve mais contato com Liszt, pois não estava afeiçoado a todo aquele movimento de “grandiosidades” e “revoluções musicais” que reinava em Weimar. Suas obras eram tidas como puras, profundas e sentimentais, e eram criticadas e rejeitadas por toda a horda de seguidores (entre músicos, estudiosos e críticos) que julgavam-se apreciadores da verdadeira música: a que Richard Wagner e Franz Liszt estavam fazendo.

Anos se passaram, até que Brahms conheceu aquela que seria seu grande amor e inspiração: Clara Schumann. Pianista excepcional, Clara era esposa de Robert Schumann, que tornou-se grande amigo e apoiador de Brahms, mas tomado pela insanidade, foi posto num manicômio, onde veio a falecer.

Brahms passou a ser um grande sustentáculo, então, para Clara. Devotou-lhe a mais pura e sincera amizade, e jamais aproveitou-se da falta de Robert. Na mesma época, sua carreira passou a piorar, com sucessivos fracassos de suas músicas. O compositor entrou numa grande onda de tristeza.

Mas foi no mais fundo de sua depressão que Brahms encontrou a saída, ao compor, num relâmpago de ânimo, uma obra inesquecível. E quando sua Terceira Sinfonia estreou, nem os ferrenhos seguidores de Wagner e Liszt puderam ficar alheios a seu poder. Era a redenção do espírito, do compositor mais gentil, solitário e humilde que a história já conheceu: Johannes Brahms.

No aniversário de 65 anos de Clara Schumann, Brahms saiu para comprar flores, mas encontrou a loja fechada. Voltou para casa, e decidiu dar a ela, de presente, a partitura do Terceiro Movimento desta Terceira Sinfonia.

Esteja pronto para o tema principal, tido como o mais belo de toda a obra de Brahms, pois em alguns pode causar profunda tristeza, noutros o escuro da solidão, e noutros ainda o vislumbre da beleza do desconhecido. A obra resume a alma do artista, imbuindo-se de diferentes atmosferas, que intercalam-se de modo bastante sutil, hora imprimindo mistério, hora um ensaio de sorriso.

“Johannes Brahms – Terceira Sinfonia, Terceiro Movimento”:
http://www.youtube.com/watch?v=aNQSzTyvDw4&feature=related

E essa é pra relembrar os sonos da infância:
“Johannes Brahms – Lullaby”:
http://www.youtube.com/watch?v=t894eGoymio

- “Não posso compor como Beethoven, ou como Mozart, mas que eu possa ser puro como eles.”

Bom proveito!

terça-feira, 6 de maio de 2008

#22 - Um Conto das fadas emo de Tim


Chegara o ano de 1990, e uma dupla inseparável havia ganho imenso prestígio no mundo cinematográfico, após seus trabalhos com “Bettlejuice” (Os Fantasmas se Divertem, 1988) e “Batman” (1989). O diretor Tim Burton e o compositor Danny Elfman haviam consolidado, com estes dois (até então) últimos trabalhos uma parceria bastante eficaz, geradora de um conteúdo estilístico que veio a ser a marca registrada dos filmes de Tim: a operística em preto e branco, clima de mistério e muitas olheiras.

Mas em 1990 foi lançado o filme que seria, por muitos, considerado a obra-prima do diretor. Tratava-se de “Edward Scissorhands” (Edward Mãos-de-Tesoura), uma fábula criada pelo próprio Tim, em que um cientista amalucado desenvolve um rapaz. Numa tragédia, o cientista morre sem dar a ele um último detalhe: mãos humanas. A solitária criatura, então, é descoberta acidentalmente por uma vendedora de cosméticos, que encantada e compadecida, decide leva-lo daquela mansão abandonada para morar com sua família.

O compositor da trilha, Danny Elfman, apesar de já portar na época boa experiência com grandes filmes, diz que só sentiu que poderia ser chamado de “compositor de trilhas” após ter trabalhado neste filme, que afirmou ser ter sido mais difícil que “Batman” (http://www.youtube.com/watch?v=X4ydxgekFls&feature=related), trabalho que o havia esgotado.

Em Edward Mãos-de-Tesoura Danny compôs, entre tudo, dois temas que são principais no filme. O primeiro tema escolhido chamava-se inicialmente “Edward’s Theme”, uma música profunda e extremamente sensível. Apaixonando-se de imediato por ela, Tim Burton disse ao compositor Danny que iria usa-la também na seqüência de abertura do filme. Apesar da grande empolgação de Tim, Danny não gostou da idéia, porque gostaria de usar a melodia aos poucos, conforme o mundo emocional do personagem Edward fosse crescendo e se aprofundando. Para a seqüência de abertura, cuja tônica parecia “mecanização”, Danny compôs algo que realçasse esta maquinação, imprimindo sua costumeira aura de mistério, adicionando também uma pitada de inocência.

A idéia de Danny fez muito sentido para o diretor, e assim desenvolveu-se a trilha. O tema relativo ao universo sentimental da criatura Edward passou a chamar-se “Ice Dance” (dança no gelo), e ganha força numa cena das mais belas e singelas de toda a obra de Tim, em que a personagem Kim (interpretada por Winona Ryder) dança sob uma chuva de neve, criada enquanto Edward molda, com suas mãos de tesoura, uma gigantesca escultura num bloco de gelo.

Links:

- Abertura:
http://www.youtube.com/watch?v=fNaoFNjZJ_w

- Ice Dance:

segunda-feira, 28 de abril de 2008

#21 - Metades, fases e faces


A noite já havia deitado a escuridão sobre as ruas daquela remota aldeia de pescadores. Alguns pequenos focos de luz procuravam vencer as trevas, em alguns casebres, e principalmente no precário bar da região. Lá dentro os homens jogavam conversa fora, aqui e ali.

- Chegou um cara esquisito aqui esses dias, cê viu? – pergunta um deles ao companheiro que dividia a mesa e uma cerveja.
- Fora de temporada? Vi não...

Instantes depois entra no local uma figura tranqüila e resoluta, cabelos grandes e barba espessa. Trazia os olhos profundos mais tristes do que o sorriso que parecia querer brotar de seus lábios.

- Olhaí o próprio! – cochichou o primeiro.
- Que cara esquisito... Parece daqueles poeta solitário que vive cantando nossas mulhé.
- Ah... se ele vier com esses papo... – era tarde demais, pois o assunto dirigia-se até os dois.
- Boa noite! Posso me sentar? – pediu com gentileza o “poeta solitário”.
- Pode sim, claro – disseram os dois.

Após as primeiras apresentações, e algum silêncio, um dos nativos pergunta, no meio de um gole:

- Então... que anda fazendo por essas bandas sozinho?
- Nada de mais – respondeu, com certa tristeza. – Acho que fugindo de alguma coisa.

O par da região entreolhou-se, compreendendo algo.

- Ah... tá numa fase ruim, é?
- Bom... acho que não temos fases... temos faces.

Outro olhar foi trocado pelos matutos, este mais longo e pesado. Em seguida, o homem pediu licença e apontou para o balcão, para onde dirigiu-se.

Pediu algo ao velho que atendia, pouco antes de virar o rosto, dar “Boa noite” e puxar papo com os figuras ao seu lado.

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Oswaldo Montenegro compôs música e letra da canção a seguir, que talvez seja uma das mais belas obras que postarei aqui em muito tempo. Melodia intensa, harmonia perfeita e poesia deliciosa e precisa:

- Oswaldo Montenegro – “Bandolins”:
http://www.youtube.com/watch?v=VqBj0BPZ3dU

Bom proveito!