quarta-feira, 21 de maio de 2008

"Gosto" não se discute, se trata


Ouvir um só estilo, um só tipo de música, pra mim chega a ser patológico. É mais ou menos como uma pessoa que só se permite apaixonar-se por exemplares do sexo oposto que tenham características xís que elas (sabe-se lá por que razão) estabelecem. É o que mais vemos por aí, e é um fato constante em minhas lembranças do colegial nos diálogos com meus velhos amigos.

A coisa é mais grave do que parece, porque não nos damos conta de estarmos lançando atenção exclusiva ao pacote, em detrimento daquilo que mais importa: o que somos, o que nos torna humanos, o que move um mero amontoado de carne e ossos.

Impossível a qualquer um explicar o que é música. De onde ela vem, e por que um apanhado de sons é capaz de movimentar tamanha quantidade de pensamentos, emoções, imagens e lembranças?

Embora não consigamos cogitar sua causa e origem, qualquer músico sabe por que meios essenciais a música se apresenta a nós, em nosso plano. Pra dizer de um modo geral, a união dos elementos ritmo, harmonia e melodia é o que nós classificamos como música, de um modo íntegro, por assim dizer. Sendo fato que esta linguagem utiliza-se das vibrações do ar para materializar-se (chegando assim a nossos ouvidos, cérebros, e por fim nossos espíritos), a ela precisa-se somar elementos instrumentais, através dos quais a música possa existir de fato.

Assim, fica claro que uma mesma criação musical pode adquirir sonoridades diferentes, dependendo do instrumento pelo qual surja. Eis aqui uma grande questão... É óbvio que o instrumento acaba se somando aos elementos essenciais da música (ritmo, harmonia e melodia), mas esta soma não se aplica como essência, já que tocar uma música por diferentes instrumentos não a modifica, mas apenas dá-lhe aspectos variáveis relativos.

Desse modo fica claro que quem ouve exclusivamente um estilo musical, está subordinando sua percepção e sensibilidade a uma roupagem, e não à música. Está limitando-se à proporção em que cria em sua consciência a ilusão de que o que faz uma música ser boa não é a música em si, mas o modo como ela se apresenta. É como admirar uma pessoa pela roupa que ela veste, e não por sua humanidade e personalidade.

Tendo música como profissão, brinco em minha mente com idéias musicais quase que o tempo todo, e costumo fazer algo que acredito ser bastante interessante: às vezes lembro de alguma música da moda, dessas que caem no gosto de milhões do dia pra noite, e desfaço a instrumentação dela. Deixando dela apenas ritmo, harmonia e melodia, imagino-a num arranjo simplíssimo para piano. Faço isso porque acredito que uma música que é bela, o é pela essência, e continuará sendo bela mesmo se a apresentarmos com o máximo de minimalismo. Geralmente dessas músicas citadas não sobra absolutamente nada... Mas não coloco isto como evidência da teoria, já que posso ser um péssimo arranjador... ¬¬

E como este blog não é só de ler, mas também de ouvir, tenho o grande prazer de postar, como exemplo, uma pequena obra, simplíssima e muito bonita, de autoria do veterano Kalau, artista premiado por suas trilhas teatrais. A música chama-se “A Cidade”, e é parte da trilha sonora (indicada ao Prêmio Shell) da peça “Cinema Éden”.

http://www.youtube.com/watch?v=jeP2VFTcPiw

Muito mais do trabalho de Kalau pode ser acessado em:
http://www.kalau.com.br/

Bom proveito!

1 comentários:

Anônimo disse...

Ae, Barcamor- belo texto, muito bom! Esse blog tá abrindo cabeças :)) - Parabéns

Ps. Obrigado pela citação de minha música e meu trabalho *SSSS* Saúde/Sorte/Sucesso/Sempre- Abração